NACAB - Núcleo de Assessoria às Comunidades Atingidas por Barragens

Estudo revela danos sofridos por mulheres na região 3 do Paraopeba

Feito pelo Nacab em parceria com a consultoria Saberes Populares, estudo destaca especificidades das mulheres atingidas no processo de reparação da Vale

Sobrecarga de trabalho doméstico e cuidados com a família; cansaço e problemas de saúde mental e física; insegurança alimentar e nutricional; maior exposição à violência; perda de renda e de autonomia. Esses são alguns dos danos levantados pela pesquisa que ouviu mulheres atingidas pelo rompimento da barragem da Vale, na região 3 da Bacia do Paraopeba. O estudo foi realizado pela Assessoria Técnica Independente (ATI) Paraopeba Nacab em parceria com a consultoria Saberes Populares, entre novembro e dezembro de 2021.  

Por meio de oficinas, rodas de conversa e entrevistas foi possível construir com as mulheres, e a partir delas, o retrato dos danos sofridos pelas famílias atingidas e também ampliar a compreensão sobre o que é ser mulher atingida e a luta por direitos. A análise dos dados desta pesquisa vai colaborar com a construção da Matriz de Danos para indenização compensatória da Vale, com foco na justa reparação para as atingidas e suas famílias. 

2021_12_01 - Oficina de Mulheres em Cachoeirinha (Esmeraldas)

Atividade da pesquisa na comunidade de Cachoerinha, Esmeraldas

Apresentação de resultados

Na última quinta-feira, 24 de março, a equipe técnica do Nacab e da consultoria Saberes realizou uma reunião virtual para expor resultados do estudo e um panorama sobre os danos levantados. Participaram mulheres e homens das comunidades atingidas. 

"A gente vive essa luta em relação a nossos direitos, que é uma coisa que jamais imaginávamos que precisaríamos lutar. O desastre ambiental, o desastre da vida, contaminação do Rio Paraopeba. Nós, estamos nos acabando, morrendo a cada dia em relação a tudo isso que aconteceu com a natureza. A gente vai se destruindo emocionalmente, financeiramente. A gente não sabe o que nos aguarda".
Silvéria Baeça
da comunidade de Vista Alegre, Esmeraldas, relatou durante a reunião
2021_12_03 - Oficina de Mulheres em Beira Córrego (Fortuna de Minas)

Oficina em Beira Córrego, Fortuna de Minas

Outras mulheres relataram dificuldades com abastecimento de água, perdas na produção, acesso a alimentos, aumento da poeira e acúmulo de lama dentro de casa, sobrecarga de trabalho e emocional, entre outras mudanças ocasionadas pelo rompimento da barragem e a contaminação do rio Paraopeba.  

Na ocasião, foi citado o uso da Caderneta Agroecológica, metodologia proposta nas oficinas para que as mulheres possam controlar sua produção agrícola e calcular as perdas. A caderneta considera inclusive o que é produzido para consumo, trocas e outras formas de comercialização. “Achei muito legal, porque para a gente que é autônoma é difícil contabilizar o nosso trabalho. Mas agora, com essa caderneta anoto tudo e consigo acompanhar, comparar e até planejar”, conta Tatiane Campolina, da comunidade de Cachoeirinha, em Esmeraldas. 

Participação das mulheres

A pesquisa utilizou metodologias participativas para levantamento e sistematização de danos vivenciados pelas mulheres. Foram realizadas oficinas com grupos de atingidas nos territórios. As dinâmicas promoveram espaços de falas, resgates de memórias e o registro dos saberes populares e tradicionais das mulheres atingidas, para levantar perdas que são específicas delas e de suas comunidades.

2021_12_03 - Oficina de Mulheres em Pindaíbas (Pequi)

Pesquisa em Pindaíbas, Pequi

"Como, por exemplo, precificar uma terra de raiz, que vem da ancestralidade, que faz parte da identidade de um povo? São questões profundas que a gente precisa enfrentar e trazer como prioridade. As entrevistas, conversas e instrumentos utilizados na pesquisa nos possibilitaram levantar essas falas e depoimentos de saberes guardados pelas mulheres".
Laetícia Jalil
professora e pesquisadora da Saberes Populares

A consultoria também fez entrevistas com mulheres atuantes no poder público de alguns municípios e atividades internas com integrantes da ATI Nacab.

Ao todo, foram 20 entrevistas com mulheres atingidas; sete oficinas nas comunidades, com um total de 89 participantes; entrevistas com cinco gestoras locais e a junção de dados secundários (coletados por outros pesquisadores, institutos ou por governos) dos municípios da região 3.

No saldo, o levantamento indica como as mulheres sofrem de formas específicas, e muitas vezes acentuadas, as consequências do desastre-crime ocorrido em janeiro de 2019. 

2021_11_30 - Oficina de Mulheres no Shopping da Minhoca (Caetanópolis)

Atividade realizada no Shopping da Minhoca, em Caetanópolis

Continuidade

Tanto na pesquisa quanto em outras atividades que a ATI Paraopeba realiza com grupos de mulheres atingidas, há pedidos de continuidade no trabalho com as mulheres do território. Sobre essa demanda, a assessora de mulheres e juventude da ATI Paraopeba Nacab, Ângela Oliveira, afirmou que já estão previstas nas ações da Assessoria Técnica Independente a realização de mais oficinas e encontros com mulheres ao longo deste ano.

“Estamos preparando encontros para refletir temas de interesse na reparação e trocar experiências entre as mulheres. É fundamental dialogar com elas, para que se apropriem de informações sobre seus direitos, se fortaleçam, denunciem as violações e discutam estratégias para conquista de direitos não reconhecidos”.
Ângela Oliveira
assessora de mulheres e juventude da ATI Paraopeba

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Reportagem, fotos e narração: Bárbara Ferreira
Edição de texto: Brígida Alvim