Dia Internacional de Luta contra as Barragens é marcado por mobilização e decisões importantes do juízo na reparação do desastre-crime da Vale
No Dia Internacional de Luta contra as Barragens, 14 de março, centenas de pessoas que tiveram as suas vidas alteradas pelo rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho, se reuniram pela manhã na porta do Fórum Cível e Fazendário, em Belo Horizonte. Dali, elas manifestaram suas demandas pela reparação, enquanto ocorria uma reunião com o juiz responsável pela ação civil pública, Murilo Sílvio de Abreu.
A reunião, que contou com a participação de 27 pessoas atingidas das cinco regiões da Bacia do Paraopeba e Represa de Três Marias (sendo quatro pessoas da Região 3), representantes das Instituições de Justiça, das Assessorias Técnicas Independentes (ATI) e de lideranças do Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB), foi marcada pelo intenso diálogo entre os presentes e pela apresentação de algumas situações das pessoas atingidas para o juiz.
No mesmo dia, o juiz publicou importante decisão a respeito da liquidação de danos individuais homogêneos, que são os danos que não entraram no acordo de reparação coletiva, firmado em 2021, e que, justamente por isso, continuam em discussão.
Como forma de dar continuidade ao processo, foi indicada a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) como possível perita para atuar na elaboração de critérios objetivos que visem a identificar as pessoas que sofreram esses danos e a estabelecer os valores correspondentes a cada um deles. Além disso, as ATIs foram nomeadas para atuarem como assistentes técnicas das Instituições de Justiça. Para isso, o juiz determinou que seja construído, no prazo de 60 dias, um novo plano de trabalho colaborativo entre as partes – Instituições de Justiça e Vale – e seus respectivos assistentes técnicos.
“Esse deferimento do Juiz em relação à liquidação dos danos individuais é muito importante, porque evita que cada um de nós tenha que entrar na justiça individualmente pra tentar lutar para a conquista dos nossos direitos. Coletivamente fica mais fácil, já que lutar contra uma empresa gigante sozinho é uma disputa inglória”, destaca o morador de Fortuna de Minas e membro da Rede dos Atingidos da Região 3, Rogerio Giannetti. A solicitação de liquidação dos danos individuais foi feita pelas Instituições de Justiça em agosto de 2022.
Inversão do ônus da prova
Outra novidade do processo diz respeito à inversão do ônus da prova. O significado disso, segundo o trecho da decisão que trata do tema, é que sempre que as Instituições de Justiça, seus assistentes técnicos e/ou a perícia apresentarem informações e pedidos baseados em estudos técnicos ou na experiência comum, a Vale só poderá contestá-los se apresentar provas contrárias.
Com base no exposto, nesse momento inicial da liquidação de sentença, acolho o pedido das Instituições de Justiça para determinar ‘a INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA, incumbindo à requerida provar as refutações que fizer às afirmações das Instituições de Justiça, da PERÍCIA e das Assessorias Técnicas Independentes que estejam lastreadas em laudos ou relatórios técnicos, ou na experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece’”, afirma a decisão.
Assista ao depoimento do gerente jurídico do Nacab, Alexandre Chumbinho, após a audiência:
Como foi a audiência?
Eu fiquei muito surpresa com a abertura que o juiz deu para a gente participar de fato dessa audiência. Um espaço importante e participativo que acontece pela primeira vez, dessa forma, após quatro anos de sofrimento e quase nada acontecendo. O Juiz nos ouviu atentamente e demonstrou preocupação com o que a gente está vivendo. Eu acredito que não é possível um julgamento sem de fato ouvir ambas as partes envolvidas no processo. Me senti em um momento de construção coletiva”, avalia a moradora de Esmeraldas e membro da Rede dos Atingidos da Região 3, Ana Alice Tanuri.
Encontro das Famílias Atingidas
No período da tarde, as pessoas atingidas participaram de atividade no auditório da Escola de Direito da UFMG. Na oportunidade, ocorreu um repasse de informações acerca da reunião realizada com o juiz do caso. A decisão foi discutida pelas pessoas atingidas, que reafirmaram a necessidade de seguirem mobilizadas, fortalecendo o movimento coletivo.
Também foi tratada pelas pessoas atingidas a relevância do trabalho das ATIs junto às comunidades e a necessidade da permanência dos trabalhos dessas entidades na nova etapa do processo, bem como no acompanhamento das atividades do acordo.
Nós sabemos que o momento é de fortalecimento da luta e sabemos também da necessidade de contarmos com as nossas ATIs, principalmente para concretizarmos os anexos do acordo”, destacou o representante da Rede dos Atingidos da Região 3, Rogério Giannetti.
Texto: Carlos Esteves, Marcio Martins e Sarah Zuanon
Fotos: Marcio Martins e Mathias Botelho/Instituto Guaicuy
Edição: Leonardo Dupin e Raul Gondim