Rede de Atingidos da Região 3 e ATI Nacab Paraopeba realizam um intercâmbio para conhecer uma experiência de ecossistema consolidada
Nos dias 12 e 13 de dezembro, uma delegação formada por representantes da Rede de Atingidos da Região 3 e da coordenação da ATI Paraopeba Nacab participou, na cidade de Maricá (RJ), do II Seminário do Ecossistema de Cooperação, com o tema: Novas economias, território, trabalho e transição. O evento foi um rico espaço de discussão sobre experiências e estratégias para compreender as novas abordagens econômicas territoriais e as dinâmicas de relação com o trabalho dentro do processo de transição frente às crises do atual modelo industrial, financeirizado e globalizado.
Há mais de uma década, Maricá estabeleceu regras para a utilização dos recursos dos royalties do petróleo extraído na região, com a criação de um fundo soberano para promover o desenvolvimento local sustentável. Este fundo possibilitou a construção de políticas públicas com ampla participação e controle social, como a criação da moeda local mumbuca, que permite que os recursos financeiros circulem no próprio território, transporte gratuito, formação em economia solidária em toda rede escolar, poupança popular, políticas de agricultura urbana e rural integradas em circuitos curtos de comercialização, fomento à criação de praças de alimentação e à agroecologia, entre outras.
Esse sistema possui afinidade com a experiência que está sendo construída pelos atingidos da Bacia do Paraopeba. Ambos os modelos impulsionam a cooperação e a transição, além da produção de novos campos de atuação, sobretudo para o engajamento local. Nesse contexto, o Seminário de Maricá foi um produtivo espaço de articulações entre a Rede da Atingidos, a ATI Paraopeba Nacab e o Ecossistema local, uma vez que as duas experiências vivenciam processos semelhantes e podem enriquecer a construção dos arranjos territoriais.
O encontro serviu ainda para mostrar que não estamos sozinhos e que há um horizonte de muitas possibilidades para pensar e agir de forma diferente. Todas as experiências analisadas do ponto de vista prático e teórico apontam que a cooperação não nasce do acaso: ela deve ser planejada e induzida para a construção de uma nova cultura organizacional. Experiências de modelos de ecossistemas na França, onde já há um amadurecimento do tema, a partir das diretrizes da Economia da Funcionalidade e Cooperação, em conjunto com estas que nascem no Brasil, são faróis que apontam um caminho novo de transformação para reparação dos diversos danos vivenciados Bacia do Paraopeba.
Neste momento em que há previsão de retomada das ações da entidade gestora para definição dos critérios de utilização dos recursos do Anexo 1.1 do acordo judicial que trata dos projetos de demandas das comunidades, crédito e microcrédito, a construção da estratégia do Ecossistema de Cooperação e Transição na Região 3 mostra-se um modelo muito potente em direção ao que queremos construir. Assim, há muito que se aprender e trocar conhecimentos com os grupos e gestores de Maricá.
Os ecossistemas criam uma nova dinâmica e perspectiva territorial para solidariedade e transição ecológica de acordo com a forma como cada comunidade ou grupo organiza suas atividades sociais e econômicas. Da riqueza destes processos nasce uma nova engenharia capaz de criar soluções locais para retomada e fortalecimento das atividades da reparação socioeconômica.
Trata-se de construir uma nova narrativa para promover uma organização reflexiva a partir da participação e engajamento de todos os atores locais comprometidos com as mudanças necessárias. Não há futuro sem críticas ao modelo atual, que coloca em risco a biodiversidade, a preservação e proteção do solo, a segurança hídrica, alimentar e nutricional e a capacidade de gerar e preservar os bens materiais e imateriais. Hoje o modelo predatório da mineração é um grande risco para todos, principalmente aqueles que já são vítimas dos seus crimes e impactos.
É urgente a necessidade de construir soluções no nível territorial a partir dos valores intrínsecos locais, da governança participativa e das regulações em todos os níveis. A cooperação é hoje o melhor caminho para construção de redes consistentes, colocando a centralidade da vida baseada em novos parâmetros econômicos para criar a emancipação das comunidades e grupos produtivos.
Texto: Luciano Marcos
Imagens: Acervo Nacab