Encontro com grupos da região 3 teve reflexão, debates, afeto, fé, reconhecimento e luta
Como o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho afetou manifestações e práticas de pessoas e grupos de tradição de matriz africana? Um dos estudos desenvolvidos pela Assessoria Técnica Independente do Nacab, em parceria com o Centro Nacional de Africanidade e Resistência Afro-Brasileira (Cenarab), busca identificar esses danos na região 3 do Paraopeba.
Nos dias 24 e 25 de setembro, essas instituições promoveram um encontro em Belo Horizonte, com representantes de Povos e Comunidades de Tradição Religiosa de Matriz Africana (PCTRAMA), para aproximação, reconhecimento e alinhamento. Nele, eles puderam se apresentar, trocar experiências e falar sobre as perdas causadas pelo desastre-crime que ocasionou a contaminação do Rio Paraopeba.
Na abertura, sexta-feira, 24, na sede do Cenarab, o encontro foi marcado pela manifestação da cultura ancestral dos povos presentes, destacando-se o som dos cantos, palmas e tambores. Estiveram presentes membros de grupos e comunidades das regiões que circundam os municípios de Esmeraldas, Pará de Minas e Paraopeba.
O espaço de reforço, identificação de demandas, anseios, que envolveu também festejo e luta, teve sequência no sábado, 25, na Escola Sindical 7 de Outubro. Neste dia, o Nacab apresentou sua forma de atuação e envolveu os participantes no debate sobre os impactos do rompimento em suas vidas e práticas.
Makota Celinha, coordenadora do Cenarab, considerou o encontro oportunidade de reconhecimento, empatia, troca e construção coletiva. “Gosto muito da ideia do espelho do reflexo. Eu me vejo no outro, eu sinto o outro, eu tenho o olhar da dor do outro. Um encontro como este é um momento de vivenciar os múltiplos olhares para uma mesma realidade, a realidade do descaso”, afirmou.
Vínculo com a natureza
As crenças e religiões de matriz africana têm íntima relação com a natureza. A Ialorixá Gal de Oyá, do município de Esmeraldas, reforçou a preocupação com os impactos negativos sofridos pelo rio e seu entorno. “A cultura afro-brasileira vive da natureza, ela precisa das águas, dos rios, das cachoeiras, precisa das ervas colhe na natureza. Então, se as nascentes morrem, as águas diminuem ou não tem água, não tem fundamento. Nossos fundamentos são levados às beiras dos rios, nas cachoeiras. Nossos Iaôs são iniciados nas cachoeiras, os primeiros Ebós de um Iaô são feitos na cachoeira, então a gente depende das águas”, explicou a autoridade religiosa, referindo-se a um dos rituais do candomblé.
Wantuil Reis Ferreira, presidente da Guarda de Congado de Nossa Senhora do Rosário, da comunidade de Soledade, no município de Pequi, vivenciou lembranças e memórias: “Este encontro está sendo importante, pois estou reconhecendo muitas coisas da minha cultura, outras que a gente não tinha conhecimento e fazendo vários amigos. Hoje está muito difícil mexer com isso, o pessoal está esquecendo da cultura”, descreveu.
Levantamento de danos
A pesquisa com Povos e Comunidades de Tradição Religiosa de Matriz Africana (PCTRAMA), realizada pelo Nacab em parceria com o Nacab, tem o objetivo de levantar os prejuízos materiais e, principalmente, as perdas imateriais e simbólicos sofridas por essas pessoas e grupos. “O que impactou na vida e na renda, na segurança alimentar e nutricional, na produção, nas atividades econômicas, no meio ambiente, na qualidade da água, do rio, nos animais… Tudo que as pessoas falaram, suas demandas e propostas de projetos, nós vamos aprofundar, debater em outros momentos, qualificar e ver como contribuir para lutar e recuperar tudo isso”, enfatizou Flavio Bastos, coordenador geral da ATI Paraopeba Nacab.
Saiba mais sobre a pesquisa: Identificação de danos em povos de religiões de matriz africana — Nacab
Confira as fotos de cobertura do Encontro dos dias 24 e 25/09:
Reportagem: Marcos Oliveira
Fotos: Bárbara Ferreira, Marcio Martins e Marcos Oliveira
Assessoria de Comunicação ATI Paraopeba Nacab