Equipe multidisciplinar percorreu toda a região 3 da Bacia do Paraopeba levantando os problemas causados pela enchente deste ano. Uma das preocupações é a saúde fragilizada das pessoas atingidas
A Assessoria Técnica Independente (ATI) Paraopeba Nacab finalizou no último sábado, 5 de fevereiro, a primeira etapa do monitoramento das cheias na Região 3 da Bacia do Paraopeba, que é de mapeamento e coleta de registros e informações, para avaliação dos danos.
Nessa fase, foram visitadas mais de 150 propriedades durante três semanas de trabalho.
A atividade teve início logo após a enchente causada pela cheia do rio Paraopeba em janeiro deste ano, que atingiu inúmeras comunidades, deixando um rastro de lama e destruição.
Segundo a especialista da gerência socioambiental da ATI Paraopeba Nacab, Dayane Lopez, o cenário encontrado ao longo da calha do rio é de calamidade e desolação. “Um grande volume de rejeito foi depositado nas áreas de várzea, nas planícies inundáveis. E o que vimos são áreas de plantio totalmente devastadas pelo rejeito, edificações inundadas pela lama com trincas e rachaduras apresentando risco de desabamento. São acúmulos de violações que ocorrem desde o rompimento da barragem, em 2019, e que são acentuadas com as cheias”, ressaltou a especialista.
Levantamento feito em Esmeraldas
O monitoramento teve início no município de Paraopeba e passou por outros oito municípios às margens do rio, dentro da área de atuação da ATI Paraopeba Nacab (Fortuna de Minas, Florestal, Pará de Minas, São José da Varginha, Pequi, Papagaios, Maravilhas, Esmeraldas).
Nos últimos dias foram visitadas as 9 comunidades ribeirinhas de Esmeraldas, onde foram retratados danos nas áreas produtivas como pastos e plantações, danos estruturais em casas e outras construções, além de um levantamento das demandas de água, silagem, ração para os animais e apoio à saúde das pessoas.
Na comunidade de Taquaras, o morador Onofre Felício Sobrinho conta que teve sua casa completamente coberta pelo rio. “Eu perdi tudo! Não sobrou nada. A plantação já estava produzindo milho, amendoim, abóbora, melancia, mandioca, mas acabou tudo. Acabou meu sonho, porque eu comprei aqui porque gosto de plantar e pescar, mas desde o rompimento é só desgosto. O meu pessoal já nem fica mais por aqui com medo de contaminação”, conta Onofre que mora a menos de 100 metros das margens do rio. O atingido relatou que não conseguiu receber nem mesmo o auxílio emergencial que deveria ser pago pela mineradora desde 2019.
Em situação semelhante, Marco Antônio Rodrigues, morador da comunidade de Padre João, teve que sair às pressas de sua casa quando percebeu o rio subindo. “Você não imagina como fica o emocional de uma pessoa que dedicou toda a sua economia para construir a casa e de repente acontece isso. Eu saí para não morrer. Só peguei o carro e o resto eu perdi tudo. É só tristeza!”, relata Marco Antônio, que teve a casa comprometida com graves danos estruturais, como a queda de paredes e telhado.
Danos à saúde
Além das perdas materiais, as pessoas que tiveram contato com a lama e a água da enchente relatam o aparecimento de problemas de saúde. Os sintomas mais comuns são: coceira na pele, feridas, náusea, dor de cabeça e diarreia.
A caseira e pintora Édina Xavier da Silva relatou para a equipe do Nacab que precisou limpar sua casa e teve muito contato com a lama. “A água chegou a mais de três metros aqui. A gente está tirando a lama pra poder ficar dentro da casa. A gente não tem pra onde ir. Eu sou alérgica a ferro e estou sentindo muita coceira e dor em meu corpo. Eu até estou passando álcool depois do banho pra aliviar a coceira. Sem falar a cabeça. A gente dorme pensando na lama e acorda pensando nela”, relatou.
A especialista em saúde da Gerência de Qualidade da Água e Risco à Saúde Humana da ATI, Caena Rodrigues Conceição, acompanhou as visitas nas comunidades atingidas de Esmeraldas e colheu relatos das pessoas que apresentaram algum sintoma após contato com a lama e a água do Paraopeba.
“É devastador quando a gente vê o estado de saúde das pessoas atingidas. Temos ouvido diversas queixas, tanto emergenciais quanto de problemas crônicos que foram agravados diante da questão das enchentes. Encontramos problemas de pele, respiratórios, de alergia, hipertensos que precisaram aumentar a dosagem da medicação e, principalmente, problemas relacionados à saúde mental, que acaba sendo negligenciada nesse cenário. Temos visto um agravamento do sofrimento psíquico extremamente profundo nas pessoas atingidas”, descreve Caena.
Segundo a especialista, é comum haver problemas de saúde pós enchentes, como infecções, hepatite A, leptospirose e outras doenças. No entanto, a enchente do Paraopeba, por transportar rejeitos da mineração, oferece também o risco de contaminação por metais pesados como o ferro e o manganês. Segundo a especialista da saúde, eles podem chegar a causar danos neurológicos.
Portanto, ela recomenda que pessoas atingidas que tiveram contato com a lama e estão apresentando sintomas como os aqui relatados devem procurar um atendimento médico o quanto antes e também informar ao analista do Nacab que atende a sua comunidade.
Informe-se mais sobre cuidados com a saúde durante o período de fortes chuvas, em cartilha preparada pelo Nacab.
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Reportagem e narração: Marcio Martins
Fotos: Marcio Martins e Grax Medina
Edição: Brígida Alvim