Com a proposta de ampliar a participação popular no tema, encontro reuniu representantes das comissões de pessoas atingidas da Região 3 para dialogar sobre o Plano de Reparação Socioambiental previsto no Acordo Judicial
Em um encontro realizado na terça-feira, 24 de maio, a ATI Paraopeba Nacab apresentou aos representantes das comissões de atingidos da Região 3 informações sobre Plano de Reparação Socioambiental da Bacia do Paraopeba. Previsto no Anexo II do Acordo Judicial de Reparação, o plano está sendo elaborado pela empresa Arcadis, contratada pela Vale. Pelo acordo de reparação assinado em fevereiro de 2021, esse plano é de responsabilidade integral da mineradora, responsável pelo desastre-crime.
O encontro foi realizado em Belo Horizonte e teve a participação de cerca de 40 representantes de todas as comissões da Região 3. A principal demanda das comunidades é a ampliação do debate e a possibilidade de participar ativamente desse processo, seja acompanhando e monitorando o levantamento de dados, seja escolhendo as melhores alternativas para reparar o meio em que vivem.
“Estamos trazendo pela primeira vez esse debate de forma mais estruturada para as pessoas atingidas. Trazendo os problemas do contexto em que o plano está inserido e apresentando o instrumento que será responsável por essa reparação. A ideia é tentar construir uma pauta coletiva de conquista política das pessoas atingidas na participação desse eixo do acordo (anexo II)”, explicou o especialista da gerência socioambiental, Lucas Grossi.
Para a gerente socioambiental da ATI Paraopeba, Irla Paula Rodrigues, o maior desafio para a Região 3, além da falta de participação, são diversos danos que não estão reconhecidos dentro do plano, como a poluição do ar e a deposição de rejeitos agravada após as cheias do Paraopeba no início de 2022. Além do Plano de Reparação Socioambiental, também foi apresentado aos participantes, informações sobre o monitoramento das cheias de 2022, que trouxeram ainda mais danos para o território.
“A ATI tem feito alguns encontros com as pessoas atingidas, mas ainda não tínhamos tido um momento específico para debater a reparação socioambiental. Sabemos que é difícil trabalhar a reparação de um dano que aconteceu ali no rio, com os recursos que esse rio, essa mata, esse solo, essa terra oferece. Que bom que tivemos a oportunidade desse momento. Fomos formalmente convocados pelas Instituições de Justiça para trabalhar com esse tema no território e isso é um avanço”, declarou Irla.
Comunidades cobram participação
A participação também foi cobrada pelas lideranças, representadas durante o evento pela moradora de Taquaras, em Esmeraldas, Patrícia Passarela. Em sua fala, ela traz o exemplo de sua comunidade, que se articulou para envio de ofícios, para acionar a Vale questionando sobre os impactos ambientais e, principalmente, chama as outras comissões para se juntarem na cobrança por mais presença e autonomia das pessoas da Região 3 sobre a reparação socioambiental.
“Nós temos nos organizado enquanto comunidade e são vários atores que invadem a nossa comunidade, não nos informam o que estão fazendo, para que estão fazendo e para quem estão fazendo. Então com frequência abordamos os veículos da Vale para saber do que se tratam as análises – de água, de rio, de poços. Afinal o território é nosso e não da Vale. E essa luta vale a pena. É para as gerações futuras aprenderem que temos direitos como cidadãos. Que o meio ambiente é de todos e temos que preservá-lo. Chamo a todas as comissões para fazer essa luta. Não é só chegar e fazer. Eles têm que nos ouvir”, convocou a moradora de Esmeraldas, durante o encontro.
Morador da comunidade de Pindaíbas, em Pequi, o agricultor Rildo Israel da Costa conta que além da importância do evento para o compartilhamento de informações, o encontro com pessoas de outras comissões e o exemplo da luta de Taquaras também traz outras perspectivas para as estratégias na busca pela reparação.
“Acho que foi um momento muito importante, com a participação de todas as comunidades. As pessoas as vezes são atingidas e nem sabem e pode ser que no futuro tenhamos vários prejuízos. Precisamos participar, correr atrás dessa reparação. Apesar de algumas lacunas e dificuldades acho que o caminho é ter esses encontros e eventos para que a gente possa se unir e fazer isso acontecer”, comentou o agricultor.
Próximos passos
A partir desse encontro, serão realizadas rodas de conversa em campo para ampliar o acesso das pessoas atingidas ao que está previsto no Plano de Reparação Socioambiental.
Para a especialista da Gerência de Qualidade da Água e Risco a Saúde, Thaissa Oliveira, o principal desafio é garantir a participação das pessoas atingidas e da assessoria técnica dentro da governança desse plano. Ela também reforça que vários danos já foram identificados pela ATI Paraopeba Nacab e relatados por moradores e moradoras da região, mas não estão contemplados no escopo da reparação socioambiental.
“Queremos trazer nossos estudos, combiná-los com o que está sendo pautado pelo plano junto aos atingidos e atingidas para que esse plano ganhe mais força e consiga absorver as nossas demandas”, explicou a analista.
Entenda mais
O Plano de Reparação Socioambiental da bacia do Paraopeba prevê investimentos de R$ 5 bilhões para sua execução, sem que haja um teto financeiro. Ou seja, mesmo que o recurso previsto acabe, as ações de reparação devem continuar até que todo o meio ambiente da bacia do Paraopeba esteja recuperado em sua totalidade. Além deste valor, também estão previstos no Acordo Judicial a aplicação de R$ 1,55 bilhão em 46 projetos já pré-definidos de compensação ambiental e R$ 2,05 bilhões em projetos de segurança hídrica para o rio Paraopeba e o rio das Velhas.
Quais são os objetivos do Plano de Reparação Socioambiental e do Anexo II do Acordo Judicial?
- Remediar os danos causados pelo rompimento
- Restituir os ecossistemas afetados e condições biofísicas das áreas afetadas
- Restaurar as condições de infraestruturas locais afetadas
- Reparar as perdas sociais e econômicas na região afetada
- Recuperar as áreas atingidas e promover a sua ressignificação
- Reparar a perda da memória e do patrimônio cultural
Quais são os impactos reivindicados pelas comunidades?
FAUNA, FLORA E SERES VIVOS
- Perda de habitat aquáticos
- Perda de indivíduos da ictiofauna (peixes)
- Redução da capacidade dos cursos d’água em recuperar naturalmente suas características ambientais.
- Perda de habitat terrestre
- Perda de indivíduos da flora (vegetação)
- Perda de banco de sementes
- Redução da migração de genes das espécies vegetais
- Redução da cobertura vegetal
SOLO, ÁGUA E AR
- Mudança das características do relevo
- Intensificação de processos erosivos no solo
- Alteração das características de formas de vida dos cursos d’água
- Alteração na qualidade do ar
- Assoreamento de corpos hídricos
- Interrupção das atividades minerárias (extração de areia)
MODOS DE VIDA
- Perda de moradia, desalojamento e desabrigo da população.
- Perda de áreas produtivas e animais de produção.
- Perda de patrimônio cultural material.
- Perda de patrimônio particular.
- Interrupção de acessos e aumento no fluxo de veículos.
Ouça essa notícia:
Texto, fotos e narração: Bárbara Ferreira
Edição: Raul Gondim e Leonardo Dupin