Atos no dia 25 de janeiro celebraram a memória de vítimas do desastre-crime e reivindicaram reparação dos danos na bacia do Paraopeba
Reunindo emoção, saudade e muita resiliência, na manhã do dia 25 de janeiro de 2023, foi realizada a IV Romaria pela Ecologia Integral a Brumadinho.
O evento contou com atos que marcaram os 4 anos do desastre-crime da Vale na mina do Córrego do Feijão, a memória das 272 vítimas, conhecidas como joias, e a luta não apenas pela reparação justa e integral, como pela punição dos responsáveis por um dos maiores crimes ambientais do planeta.
Após um momento de acolhida das romeiras e romeiros, o dia foi iniciado com uma coletiva de imprensa e a abertura do espaço do projeto Juntos por Brumadinho, que contou com as participações de representantes de movimentos sociais, pastorais, comunidades atingidas e assessorias técnicas.
A especialista da gerência de reparação socioeconômica da ATI Paraopeba Nacab, Leila Regina, foi uma das participantes da coletiva, representando as Assessorias Técnicas Independentes que atuam no processo de reparação do desastre-crime.
“Esse crime se repete no dia a dia e a reparação ambiental não é só urgente como necessária para interromper um ciclo de morte de vidas humanas e de todas as formas de vida da natureza. No trabalho das assessorias técnicas alguns estudos estão sendo realizados, em relação à qualidade das águas, e além de identificar quem são os criminosos é importante garantir a visibilidade de quem são. A palavra final não pode ser da criminosa, não é ela que reconhece quem é ou não atingido ou atingida, a área contaminada, até onde a água está poluída ou dizer que as águas podem ser consumidas, na alimentação, na irrigação ou na criação de animais”, afirmou Leila.
Representando os Povos e Comunidades Tradicionais de Religiosidade de Matriz Africana (PCTRAMA), a Mãe Indoloyá, do terreiro Nzo Atim Kimbé Loyá, em Esmeraldas, lamentou que, apesar das provas levantadas, ainda é necessário esperar que os danos sejam reconhecidos e questionou como os responsáveis pelo crime ainda conseguem dormir e caminhar sem peso na consciência.
“O homem desmata, logo perde seu alimento; os rios transbordam e a água se espalha, atingindo suas casas e empresas. Cava brutalmente a terra em busca de minério e pedras preciosas, a montanha desce e regiões inteiras são destruídas. Que nós, povos tradicionais de matriz africana, que acreditamos na ancestralidade, possamos refletir nossa importância em manter viva a fraternidade, a luz, a coragem e despertar o melhor entre nós e no próximo. Nossas folhas, ervas sagradas e águas, toda a natureza está impura e não podem ser utilizadas em nossas rotinas e ritos. É necessário progredir sem destruir, investir no instruir, crescer sem agredir, sem derrubar”, disse Mãe Indoloyá.
Missa e caminhada relembram 272 joias
Após a coletiva de imprensa, em frente à Igreja matriz de São Sebastião, foi realizada uma missa em memória das vítimas. Em sua homilia, Dom Vicente de Paula Ferreira, bispo auxiliar da Arquidiocese de Belo Horizonte, reforçou o pedido de justiça, diferenciando-a da vingança, como um grito de não à anistia e um basta à impunidade, através de julgamentos e prisões.
“É hora de reconhecer que existem alternativas entre nós, na agroecologia, no cultivo das fontes de águas, no turismo de nossas belezas naturais, na espiritualidade profunda de nossas comunidades tradicionais, na ancestralidade de nossos povos tradicionais e das florestas. Há novos horizontes abertos e resta-nos a coragem de defendê-los e ajudar os que ainda andam cegos pelas leis antigas do lucro e do capital”, concluiu Dom Vicente.
Encerrada a celebração, iniciou-se uma caminhada da matriz até o letreiro de Brumadinho, onde foi realizado um ato das famílias das vítimas do crime, com a exposição de falas e de um pequeno memorial, com fotos e cruzes no local. Momento mais emocionante da manhã, às 12h28, mesma hora do rompimento, foi realizado um minuto de silêncio e, na sequência, familiares e amigos, soltaram balões ao céu, em homenagem às 272 joias.
Tristeza, revolta e indignação
Atingido da comunidade de Beira Córrego e Retiro dos Moreiras, em Fortuna de Minas, Abdalah Nacif considera que a romaria é um momento simbólico de reflexão, que marca a luta coletiva, iniciada em 2019, e a oportunidade de somar forças entre as pessoas atingidas, desde quem perdeu familiares e amizades, a quem tem perdido o dia a dia, com a perda dos sonhos, da saúde, da renda e do lazer.
“O sentimento é de muita tristeza, pois identificamos que o principal ator do processo, que é o atingido, não é ouvido; e a leniência dos representantes das esferas judiciais com a Vale, a criminosa, deixa-nos desesperançosos. Mas também somos resilientes e essa luta nos fortalece, pois ela é coletiva, para as futuras gerações. Nós sabemos o que aconteceu hoje, mas não temos dimensão disso para o futuro, então nosso trabalho com as assessorias técnicas é ter embasamento técnico para exigir o que é nosso por direito, que é a reparação integral e justa. A luta é coletiva e se nos juntarmos seremos mais fortes”, expôs Abdalah Nacif.
4 anos na mídia
Diversas matérias e reportagens repercutiram os 4 anos do desastre-crime e o sentimento de impunidade denunciado pela romaria em Brumadinho. Separamos algumas das notícias veiculadas abaixo:
- TV Brasil | Crime Socioambiental: rompimento em Brumadinho completa 4 anos
- Observatório de Justiça e Conservação | 4 anos da tragédia em Brumadinho
- Rede TVT | Tragédia de Brumadinho completa quatro anos
- TVI Pará de Minas | Nacab comenta sobre alguns impactos do rompimento da barragem de Brumadinho em Pará de Minas
Cobertura: Marcio Martins e Marcos Oliveira
Texto: Marcos Oliveira
Edição: Leonardo Dupin e Raul Gondim