Pessoas extratoras, produtoras e comerciantes de iscas vivas se organizam para serem reparadas pelo crime da Vale e reconhecidas como Comunidade Tradicional Extrativista
Conhecido ponto de venda de iscas itens de pesca, às margens da BR-040, entre Sete Lagoas e Caetanópolis, o Shopping da Minhoca vem passando por um processo de documentação e coleta de informações, visando a certificação do coletivo como comunidade tradicional.
A busca pela certificação na categoria como Povos e Comunidades Tradicionais se dá em razão de seus saberes e suas práticas relacionados à atividade extrativista e o manejo de iscas vivas, identificados por um estudo realizado em 2021 pela ATI Paraopeba Nacab, em parceria com a empresa Confluência.
Extratores, produtores e vendedores de iscas vivas, que compõem a comissão local de atingidos, participaram posteriormente de espaços formativos sobre os direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais, nos quais compreenderam as particularidades que definem sua identidade cultural. Desde então, eles se autorreconhecem como uma comunidade tradicional que vive da produção, extração e comércio de iscas vivas.
A certificação como Povos e Comunidades Tradicionais visa fortalecer a luta pela garantia dos direitos da comunidade e a ATI Paraopeba Nacab tem assessorado a Comissão de Atingidos do Shopping da Minhoca, que se tornou recentemente também uma associação, no acesso a informações sobre as etapas e documentos necessários para a certificação de Povos e Comunidades Tradicionais Extrativistas.
O Nacab realizou ainda no local formações sobre os direitos dos povos e comunidades tradicionais, apresentando as políticas públicas e legislações especificas, mais o detalhamento do processo de solicitação de certificação junto à Comissão Estadual de Povos e Comunidades Tradicionais (CPCT-MG).
O que são comunidades e povos tradicionais?
São grupos culturalmente diferenciados, que possuem condições sociais, culturais e econômicas próprias, mantendo relações específicas com o território e com o meio ambiente no qual estão inseridos. Eles desenvolveram maneiras próprias de viver, produzindo tecnologias e saberes (sobre solos, vegetação, animais, águas, etc.) que são transmitidos pela tradição e dependem do território em que vivem para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica. Esses modos de viver característicos fazem com que esses grupos se autorreconheçam como portadores de identidades e direitos específicos.
“O processo de autoidentificação da comunidade é de extrema relevância e contribui para viabilizar o acesso a políticas públicas, inclusive aos recursos específicos no processo da Reparação, envolvendo o crime da Vale, na bacia do Paraopeba”, afirma a assessora de coordenação de campo do Nacab, Caena Rodrigues.
A equipe da ATI Paraopeba também tem aberto canais de discussão sobre o processo de tombamento de Patrimônios Históricos Culturais Imateriais, estabelecendo um caminho de diálogo junto à Secretária de Cultura de Caetanópolis, visando o Tombamento e a preservação da comunidade e de seus saberes, como patrimônio cultural imaterial do município.
O Decreto 47.289 regulamenta a Lei Estadual 21147, de 14/01/2014, é referência para este processo, ao instituir a política estadual para o desenvolvimento dos povos e comunidades tradicionais de Minas Gerais e os procedimentos para: reconhecimento formal da autoafirmação identitária dos povos e comunidades tradicionais; identificação, discriminação, delimitação e titulação dos territórios tradicionalmente ocupados por povos e comunidades tradicionais; e o mapeamento dos povos e comunidades tradicionais.
“Uma base de quinhentas pessoas aprendeu a criar minhoquinhas comigo. Isso é uma honra e fico alegre em ver as pessoas passando o que ensinei uma para as outras. Desejo ver mais gente criando minhoquinhas, pois estou ficando velho e, assim, as crianças ficarão encaminhadas para criarem suas famílias. No Shopping da Minhoca, em Paraopeba e em Caetanópolis, o ramo de iscas é muito importante. A pesca é a nossa vida”, reforçou Dirceu Vaz Ribeiro, mais conhecido como Mula, criador e vendedor de minhoquinhas no Shopping da Minhoca.
“A gente merece essa certificação, pois nosso trabalho é algo que passa de geração para geração, não é de agora, é o sustento da família da gente. Vejo que essa certificação mais o tombamento é algo importante para extratores e criadores de minhoca, os artesãos, e vai trazer muitas melhorias pra nós, já que vou poder sair e arrancar minhas minhocas, transportá-las até o Shopping da Minhoca, tranquila, e vender com menos medo”, contou Elenilda Lopes, extratora de minhocuçu e moradora da comunidade Buriti do Barro, em Paraopeba.
Texto, fotos e vídeo: Marcos Oliveira
Edição: Leonardo Dupin