NACAB - Núcleo de Assessoria às Comunidades Atingidas por Barragens

Vale revolta moradores ao afirmar que rejeito não atingiu comunidades da Região 3 

Mineradora têm realizado reuniões no território atingido apresentando resultados de análises de solo e rejeito

Na segunda quinzena do mês de novembro, a Vale esteve em comunidades atingidas pelo desastre-crime da Mina Córrego do Feijão, realizando devolutivas de estudos relacionados aos solos e rejeito. Na Região 3 da bacia do Paraopeba, as reuniões ocorreram nos municípios de Esmeraldas e em Fortuna de Minas. De forma a minimizar os efeitos do rompimento no território, durante os encontros a Vale tentou negar e diminuir a presença e os impactos do rejeito nas comunidades atingidas da região. 

Apesar de ter assinado um Termo de Compromisso e Cooperação (TCC) e de estar realizando a remoção do rejeito trazido pela enchente de janeiro de 2022 em quatro comunidades de Esmeraldas, a Vale nega que o que está sendo retirado desses locais provenha do rompimento, afirmando que o material é apenas sedimento. A mineradora tem distribuído materiais de comunicação que afirmam que o rejeito não é tóxico. Ela também afirma que não foram encontradas áreas com solo contaminado ao longo da bacia.

A equipe técnica do NACAB considera preocupante estes materiais não alertarem sobre os possíveis riscos à saúde em caso de retomada do uso das áreas alagadas e/ou de contato com o material depositado pelas cheias. Isso porque as análises realizadas pela Vale não trazem o detalhamento de informações que as análises dos Estudos de Avaliação do Risco à Saúde Humana e Riscos Ecológicos (ERSHRE) pretendem apresentar.  

Em reuniões realizadas nas comunidades esmeraldenses de Padre João e Taquaras (dia 17 de novembro) e no município de Fortuna de Minas (30 de novembro), a empresa afirmou para as pessoas atingidas e distribuiu materiais apontando que o rejeito que desceu o rio Paraopeba não ultrapassou o município de Juatuba, na Região 2. O argumento da mineradora é que o material depositado às margens do rio não é exatamente igual àquele presente na barragem que rompeu, embora seja importante destacar que a empresa não realizou coletas em Fortuna de Minas após as cheias de 2022. 

Mineradora afirma que material trazido do fundo do rio Paraopeba pelas enchentes não possui relação com o rejeito da barragem que se rompeu. Foto: Marcio Martins

Pessoas atingidas rebatem mineradora

A afirmação gerou revolta nas comunidades. Ana Alice Tanuri, moradora de Padre João, comunidade que fica ao lado de Juatuba, ressalta a preocupação com novas enchentes e de ter que conviver com o rejeito que ainda se encontra nos quintais das casas.  

“Eu moro a mais ou menos 15 km de distância da termoelétrica que fica em Juatuba. É o município vizinho! Eu fico pensando, será que tem um semáforo para o rejeito que o impede de ultrapassar o limite do município? Como que ele fala que o rejeito não chegou aqui, se eu estou vendo esse material diferente em nossa terra? Eu saio dessa reunião com a preocupação dessas informações serem repassadas pela comunidade e as pessoas voltarem a usar o rio e acabarem se contaminando”, destacou Ana.  

“Nós não aguentamos mais essa enrolação que a Vale fica com a gente. O que nós queremos é a nossa vida de volta. Se isso não é rejeito e a lama não é tóxica, por que o meu pomar não dá mais frutos como antes do rompimento?”, questionou José Paulo, morador da comunidade de Taquaras.  

Moradores de Esmeraldas questionaram afirmações da mineradora durante reunião na comunidade de Taquaras. Foto: Marcio Martins

A atingida Fernanda Souza, de Fortuna de Minas, ressalta que a diferença é que antes a água não era contaminada e agora é. Antes era só barro, agora é com chumbo, manganês. Antes, a enchente deixava o solo mais fértil. Agora onde passa, mata tudo e o solo fica infértil.” 

Morador do mesmo município, o atingido Ronaldo Fonseca, relata que “nas lagoas naturais, onde eram berçários dos peixes, as águas vão secando e os peixes morrendo, não aguentam esperar a próxima temporada de chuva. A gente vê que o rejeito compromete a permeabilização. Eu nunca vi um rio Paraopeba tão violento em degradação nas margens. A reserva de mata ciliar que tinha 50 metros na margem do rio, reduziu para 5. Reduziu muito”. 

Reunião aconteceu também em Fortuna de Minas, um dos municípios atingidos pela contaminação do rio Paraopeba e pelas enchentes. Foto: Brígida Alvim

Alerta à saúde

O Nacab alerta que a situação de risco à saúde por contato com o material trazido do rio continua, haja vista que o IGAM mantém sua recomendação de não utilização da água bruta do rio para qualquer fim, como medida preventiva, no trecho que abrange os municípios de Brumadinho até o limite da UHE de Retiro Baixo em Pompéu (aproximadamente 250 km de distância do rompimento). 

Matéria: Marcio Martins, Brígida Alvim, Gerência de Reparação Socioambiental e Gerência de Qualidade da Água e Avaliação de Risco à Saúde 

Edição: Raul Gondim 

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