ATI Paraopeba Nacab continua monitoramento para avaliar a situação das comunidades da região 3 do Paraopeba após enchentes de janeiro deste ano
No início de 2022, as fortes chuvas geraram, mais uma vez, uma série de danos às pessoas atingidas pelo desastre-crime da Vale. Com o transbordamento do rio Paraopeba, o rejeito depositado no leito desde o rompimento da barragem em Brumadinho, há três anos, atingiu diversas comunidades da região 3 da bacia. Para dimensionar o alcance das cheias e dos danos, a ATI Paraopeba Nacab realiza visitas com equipes multidisciplinares, que levantam e registram as consequências.
Em reportagens anteriores, mostramos a realização do trabalho de monitoramento de cheias na zona rural de Paraopeba e em comunidades de Fortuna de Minas.
Na última semana, foram percorridas a zona rural de São José da Varginha, de Pequi e de Pará de Minas. Nesses municípios, em comunidades, chacreamentos e propriedades que ficam às margens do rio, a água avançou e deixou plantações, pastos e casas imersas em lama contendo rejeitos da mineração. Para exemplificar algumas das situações vividas nessas localidades, contamos nesta reportagem os danos sofridos por Ireny e Heber.
Insegurança e falta de água
A trabalhadora rural Ireny Gonçalves Pereira estava na fazenda onde vive e trabalha, em São José da Varginha, quando ocorreu a enchente, na primeira semana de janeiro.
Sua casa fica na parte mais alta da propriedade e logo pela manhã avistou a água chegando nas pastagens. “Ficamos monitorando, estávamos com medo de vir muita coisa do rio e com força. Quando foi a tardezinha a fazenda já estava toda tampada”, relata a moradora. Ela estima que o prejuízo maior é com a perda de áreas de pastagem, que serviam de alimento para as criações da fazenda.
Ireny mora no local há cerca de 30 anos, desde que se casou. Foi ali que ela aprendeu a viver da terra e viu crescer os filhos e depois os netos. A antiga casa onde morava, na parte baixa da fazenda, foi completamente coberta pela cheia. E, mesmo não sendo a residência atual, fará falta pois guardava a memória de sua família. Na casa atual, a água chegou até a porta, deixando um rastro de danos e a falta de água.
Desde então, consomem água mineral recebida por doações e entregues pela Vale, mas não há água para cozinhar, tomar banho e outros tipos de consumo diário. E a contaminação, pelo contato com a lama do rio, é um medo constante. “Estamos sem água em casa e sem água na região. A enchente tampou os nossos açudes. Já não tínhamos o rio e agora tudo acabou aqui”, desabafa Ireny.
Perdas materiais e risco à saúde
Em Pará de Minas, comunidades ribeirinhas como Córrego do Barro e os chacreamentos Paraopeba e Vargem Grande foram impactadas diretamente, tendo casas e propriedades inteiras debaixo de água, ilhadas ou com dificuldade de acesso.
Heber França da Costa é dono de um sítio no Chacreamento Paraopeba, lugar que escolheu construir pelo gosto à pesca esportiva e de onde tirava renda com aluguéis para pescadores.
A estrutura conta com barcos, pontos de pescaria e casa para temporadas. Desde o rompimento da barragem, já não é mais possível acessar o rio, os aluguéis acabaram e ele nunca mais pescou.
No início do ano, a situação se agravou, com a invasão de lama e rejeito dentro de sua casa, a destruição da plantação e de áreas de criações, além dos riscos à saúde.
“Isso tudo é a partir do rompimento da barragem em Brumadinho. Antes, a água chegava, mas atingia a altura de no máximo a metade das paredes. Depois do rompimento só foi subindo. Dessa vez ela cobriu todo o meu sítio, levou tudo, quebrou, inundou. Já tirei muito barro, rapei essa lama para o fundo do terreno e não sei se vou poder continuar aqui com essa lama tóxica”, detalha.
Heber conta que no terceiro dia que teve contato com a água da enchente, ele passou mal, teve dores de cabeça, diarreia e mal-estar. “Senti coisas que nunca tinha sentido antes de ter contato com isso, ao fazer a limpeza da minha casa”, alerta.
Próximos passos do monitoramento das cheias
As informações e fotos coletadas pela equipe do Nacab serão reunidas em um relatório técnico a ser encaminhado às Instituições de Justiça. O estudo também vai compor a Matriz de Danos, que está sendo construída pelas Assessorias Técnicas Independentes, para listar e mensurar valor de todos os danos sofridos pelas pessoas atingidas pela barragem da Vale, de forma a referenciar indenizações justas.
As visitas para monitoramento e avaliação dos danos causados pelas cheias do Paraopeba estão sendo feitas pelo Nacab em toda a região 3 do Paraopeba e nesta semana percorre comunidades atingidas dos municípios de Florestal e Esmeraldas. Continue acompanhando nossa cobertura!
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Reportagem e narração: Bárbara Ferreira
Fotos: Bárbara Ferreira e Marcos Oliveira
Edição: Brígida Alvim