A decisão defere pedido de reassentamento coletivo para comunidades em zona de autossalvamento (zas)
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Vitória das comunidades em zona de autossalvamento (zas) nos municípios de Alvorada de Minas e Conceição do Mato Dentro: No dia 17 de setembro, uma importante decisão judicial foi dada na Ação Civil Pública que reivindica um Plano de Reassentamento coletivo para as comunidades de Água Quente, Passa Sete e São José de Jassém. A Juíza da comarca de Conceição do Mato Dentro, Leticia Machado Vilhena Dias, deu sentença favorável às famílias atingidas pelo complexo Minas-Rio, da Anglo American, determinando que a empresa apresente e execute um Plano de Reassentamento em até 12 meses.
Com efeito conclusivo em primeira instância da ação aberta pelo Ministério Público de Minas Gerais em 2020, a sentença expressa: “Confirmando a LIMINAR deferida, determinar que a Anglo American apresente no prazo de 60 dias um plano coletivo de reassentamento coletivo das comunidades de Água Quente, Passa Sete e São José do Jassém, sob pena de multa de R$ 50.000,00 por dia de atraso.
Segurança das comunidades em zona de autossalvamento
Visando a segurança das comunidades, a sentença determina ainda que o Estado não deve conceder ou renovar licenças ambientais relativas a intervenções na barragem de rejeitos da Anglo American, enquanto a mineradora não concluir a remoção e o reassentamento das comunidades que se encontram próximas à estrutura.
“No MÉRITO, reconhecendo a aplicabilidade imediata da Lei 23.291/2019 e, portanto, a necessidade de se promover as adequações necessárias à sua implementação, julgo procedente o pleito ministerial para reconhecer que, nos termos da referida Lei, o Estado está impedido de conceder novas licenças ambientais cujo objeto seja o alteamento/ampliação da barragem de propriedade da Requerida até que se promova a integral remoção das comunidades existentes na zona de autossalvamento, resguardados os modos comunitários de vida e de uso da terra”.
Os custos e responsabilidades ficarão a cargo da mineradora, que deverá seguir a critérios indicados pelas comunidades, de forma a preservar suas características e direitos.
“Julgo procedente, ainda, os pedidos iniciais para determinar à Ré Anglo que promova e custeie a remoção das três comunidades, Água Quente, Passa Sete e São José do Jassém por meio de parâmetros coletivos de indenização e reassentamento, resguardados os modos comunitários de vida e de uso da terra (reassentamento coletivo); sem prejuízo da opção do núcleo familiar pelo reassentamento individual, por meio do Plano de Negociação Opcional (de caráter individual), a ser elaborado também por critérios isonômicos’.
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Prazo de execução
A sentença determina que seja estabelecido um calendário com as etapas de implantação do Plano de Reassentamento, que deverá ser executada em um ano a partir da decisão.
“Para tanto, determino que tal reassentamento se dê por meio do estabelecimento, negocial inicialmente, entre o MPMG e os réus Estado de Minas Gerais e Anglo de calendário com as etapas e modos de elaboração e execução do Plano de Reassentamento coletivo, o qual deverá ser concluído e implementado no prazo máximo de 12 meses”.
Construção coletiva
A sentença também acatou o pedido de participação ativa das pessoas atingidas na construção do Plano de Reassentamento, juntamente com a Assessoria Técnica Independente Nacab.
“Determino, também, que tal plano deverá contar com ampla participação das três comunidades e de seus representantes, por meio de suas Assessorias Técnicas Independentes já escolhidas pelas comunidades e reconhecidas no âmbito do licenciamento ambiental; bem como deverá observar a necessidade de preservação dos laços sociais e afetivos comunitários e das especificidades econômicas e culturais de tais núcleos comunitários, de modo que sua condição de vida seja igual ou melhor que a de antes dos inícios das atividades do Empreendimento”.
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Comunidades reconhecem conquista e se mantêm mobilizadas
Em reunião realizada pelo Nacab com moradores de comunidades de Água Quente, Passa Sete e São José de Jassém, na noite de terça-feira, 26 de setembro, a sentença judicial foi apresentada, pela analista jurídica Roberta Ferreira e a coordenadora territorial, Hellen Margarida da Silva, e debatida com o público.
A reação das pessoas atingidas foi positiva, por reconhecerem na sentença uma vitória na Ação Civil Pública (ACP). Elas discutiram os próximos passos e reforçaram a reivindicação de que a Anglo American se manifeste a respeito do Plano de Reassentamento comunitário, elaborado em conjunto por pessoas atingidas das três comunidades, com o apoio técnico da ATI 39 Nacab, e juntado aos autos da Ação de Cumprimento Provisório em agosto deste ano. A expectativa delas é de que a mineradora considere a apresentação deste documento no cumprimento da sentença. “A empresa não tem que fazer um novo plano de reassentamento não. Ela tem que seguir o nosso, que fizemos juntos as três comunidades, junto com a ATI, e protocolamos na Ação Civil Pública”, defende José Maria da Silva, morador da comunidade de São José de Jassém, Alvorada de Minas.
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Próximos passos
Na reunião, as pessoas decidiram continuar em diálogo com o Ministério Público e a Assessoria Técnica Independente ATI 39 Nacab, e aguardarem pela manifestação da Anglo American sobre o Plano de Reassentamento coletivo proposto pelas comunidades, assim como o devido cumprimento da sentença pela empresa.
“A sentença é muito boa, aplaudível. A juíza levou em conta os nossos direitos e necessidade de reassentamento, por morarmos em zonas de autossalvamento (Zas). Ninguém está livre do perigo, mas viver com a ameaça de uma barragem de rejeitos sobre nós é muito difícil, não dá pra ter sossego. Vem chegando o período de chuva e o nosso medo aumenta. Temos que prevenir esse sofrimento. Então, eu fiquei satisfeito e espero que essa sentença seja aceita e cumprida pela empresa em até um ano, porque é preciso tirar as comunidades dessa situação”.
José Maria da Silva, da comunidade de São José de Jassém
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“Quando vi a decisão fiquei muito feliz, mas temos que continuar vigilantes, entender e nos apropriar dessa ação como um todo, da sentença e dos nossos direitos. Temos uma sentença a nosso favor, muito boa e importante, pois determina por força de lei que a empresa faça um plano de reassentamento com a nossa participação e atenda o que é preciso para garantir a continuidade da vida que tínhamos antes da empresa chegar. Nós, das comunidades, agora estamos fortalecidos e continuaremos em luta para que a mineradora reconheça e execute o Plano de Reassentamento que já construímos com o apoio da Assessoria Técnica Independente”.
Patrícia Generoso Guerra, da comunidade Passa Sete
Confira sentença na íntegra aqui
Reportagem: Brígida Alvim – ATI 39 Nacab