NACAB - Núcleo de Assessoria às Comunidades Atingidas por Barragens

Pescadores da Região 3 debatem tradicionalidade e direitos específicos previstos no Acordo de Reparação 

Encontro em Pequi definiu pescadores artesanais que irão representar a categoria durante a construção do Plano de Trabalho do Anexo 1.1

“O rio é o açougue dos pobres”. Foi com essa afirmação que Gilberto Teixeira Duarte, atingido da comunidade de Córrego do Barro, iniciou sua fala no 1º Encontro de Pescadores Artesanais da Região 3, ocorrido no sábado, 23 de março, em Soledade, município de Pequi. O evento, que reuniu cerca de 20 pescadores e pescadoras, debateu a tradicionalidade das práticas desse grupo de pessoas, cujas famílias se alimentaram por gerações do alimento fornecido pelo rio. Desde janeiro de 2019, porém, elas não podem utilizar o rio Paraopeba, contaminado pelo desastre-crime cometido pela Vale. 

Pescadores da Região 3 trocam experiências e debatem sobre a tradicionalidade de suas práticas e a luta pela garantia de seus direitos

O encontro reuniu representantes de Fortuna de Minas, São José da Varginha, Pequi, Pará de Minas e Florestal, que relataram suas relações com a pesca e conheceram mais profundamente a Lei que os reconhece como Povos e Comunidades Tradicionais (PCTs). A compreensão da legislação brasileira em torno do tema, aliás, é de fundamental importância, tanto para o entendimento do que representa o rio Paraopeba na vida das pessoas que ali pescavam, quanto da importância desses pescadores e pescadoras para a manutenção e preservação do ecossistema local. 

“A pesca sempre foi uma fonte de alimentação para a minha família. A substituição da carne era o peixe. Eu me lembro do meu avô pegando um surubim no rio, que pesou mais ou menos oitenta quilos. Na época não tínhamos geladeira em casa, então, era tudo enlatado. Minha avó preparava, junto com minha mãe e minhas tias, e a gente sempre tinha comida saudável, mesmo não tendo condições de comprar carne. Quando [o peixe] era muito grande, como nessa situação, minha avó dividia com os filhos, com os vizinhos, e assim a gente sobrevivia"
Maria da Conceição
moradora da comunidade dos Rosas, município de Florestal

No encontro, também foram discutidos os direitos específicos dos PCTs no âmbito do Acordo de Reparação. O Nacab fez um breve relato sobre os projetos já em andamento do Anexo 1.3, e detalhou a chegada da Entidade Gestora do Anexo 1.1 ao território, cujos trabalhos se iniciaram com a construção do Plano de Trabalho, a ser entregue em junho. O foco do debate foi a organização dos PCTs para incidir nas decisões durante o período de construção desse Plano.

Os pescadores artesanais presentes optaram pela escolha de dois representantes por município. Eles serão responsáveis por levar as demandas do grupo para os espaços com a Entidade Gestora do Anexo 1.1, além de trazer as atualizações sobre as decisões que vão orientar a execução dos projetos.

Segundo o assessor de Povos e Comunidades Tradicionais da ATI Paraopeba Nacab, Sávio José, o encontro é mais um passo na organização dos pescadores e pescadoras artesanais dentro do contexto da reparação. 

“Hoje nós atendemos a oito categorias de PCTs na Região 3, e cada uma se auto-organiza da maneira que pensa ser conveniente, prezando sempre pela autonomia do grupo e trocando experiências que fortalecem a luta. Hoje os pescadores e pescadoras dão mais um passo nessa organização, conversando sobre os seus problemas específicos, refletindo sobre como o crime no rio prejudicou a atividade deles, e como vão estar fortes para reivindicar os seus direitos nos Anexos 1.1 e 1.3, e na reparação de uma maneira geral.”
Sávio José
Assessor de Povos e Comunidades Tradicionais da ATI Paraopeba Nacab

Texto e fotos: Karina Marçal 
Edição: Fabiano Azevedo e Leonardo Dupin

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